Pare, olhe, aprecie demoradamente.



Já falei aqui sobre o meliorismo.

Tenho aprendido muito com essa nova visão de mundo.

Ainda assim, apesar de dizer o tempo todo para mim mesma, e às vezes para os outros, que aprender é algo constante em minha - nossa - vida, não deixo de ter a sensação de que preciso reaprender a aprender.

Pois que agora aprendi que, se por um lado aprendi a ver o mundo de por um ângulo, por outro ainda não tinha aprendido a vê-lo em outra velocidade. Explico.

Na semana passada fui picada por algum inseto. Isto não foi problema algum (acontece todos os dias com as muriçocas de Brasília) até, depois de um dia e meio, meu pé inchar tanto que precisei procurar um médico.

Como demorou mais um dia e meio para que eu fizesse isso, já caminhava com dificuldade devido à dor que este ato causava. Daí adveio a nova lição: a dificuldade em caminhar teve que me ensinar a aprender a ter paciência, pois ao me forçar a andar mais devagar, as distâncias que percorria em dois minutos, passaram a me custar algo como 8.

Foi assim que, em um desses momentos, enquanto precisava vencer certas distâncias em mais tempo do que outrora, e em menor velocidade, ocorreram-me duas coisas.

1. A importância de desacelerar

Apesar de me gabar por ser uma pessoa que sempre para para olhar para cima para contemplar a copa de uma árvore, ou para me inclinar e cheirar uma flor que ainda não tinha me dado conta pelo caminho, ou dedicar alguns segundos a acariciar a tez de dois cachorrinhos que se banham no sol da manhã quando resolvo pegar um atalho diferente para o trabalho, ou mesmo observar um besouro curioso se debatendo de barriga para cima na grama, essa zica com meu pé me ensinou que eu até via essas coisas, mas não dedicava a elas o tempo necessário de vislumbre que mereciam.

Notava-as, parava por alguns segundos, esboçava algum sorriso, mas logo lembrava que tinham coisas para fazer e apressava o passo para seguir para quaisquer compromisso que podia ter, abandonando-as sem a devida contemplação. Agora, iso me faz pensar que tudo de repente se torna urgente, quando, "urgente é tudo aquilo que alguém não fez em tempo hábil, e quer que o outro faça em tempo recorde". Mas não vamos entrar neste mérito.

Meu ponto é que, há algum tempo, venho pensando que estamos perdendo nossa conectividade com a natureza - ou, para quem não ache graça na natureza - com as pequenas coisas da vida que nos dão prazer - o que quer que seja - em viver. Pior: se paramos para apreciar isso, não há qualidade quando o fazemos.

Não é suficiente ir até o parque para vivenciar a natureza se não nos deixamos afagar pela brisa sem reclamar que ela bagunça nossos cabelos, aquecermo-nos pelo sol sem nos queixar que está muito calor... Ou se fazemos isso contando as horas para ir embora.

Isso me ocorreu quando, ao percorrer o mesmo caminho para o trabalho de todos os dias, peguei-me mais atenta ao movimento da escola de crianças que há por ali. Repito: embora a tenha notado antes, não tinha dedicado-lhe a atenção merecida. O tempo a mais que me consumiu para chegar até meu objetivo, permitiu-me observar melhor a alegria delas, as conversas, as interações, a dinâmica. Algo que eu "via/ouvia" todos os dias, de repente, tornou-se a maior novidade do mundo!

E eu achando que aproveitava o bastante!

2. A importância de apreciar, em câmera lenta

O fato de precisar de mais tempo para conseguir concluir uma tarefa antes simples como caminhar exigiu-me muita paciência. Como uma pessoa naturalmente inquieta e multitarefa, isso, em princípio, deixou-me bastante nervosa e abalada. 

A a arte de esperar aprendida por volta dos 14 anos com a cena do teto descrita por Rubens Paiva em Feliz Ano Velho foi esquecida. E, portanto, tornou-se necessário reaprendê-la. De súbito, precisava andar mais devagar, aprender com a lentidão. Isso me pôs na pele daqueles com dificuldade de locomoção em geral.

Ao precisar enfrentar obstáculos, como trechos com pequenos declives ou subir uma simples calçada, imaginei o que não passam, todos os dias, aqueles que dependem de muletas ou cadeira de rodas para deslocamento. Em especial, pensei nas pessoas mais idosas, as quais, às custas do corpo que já não responde como antes, precisam adaptar o ritmo da sua marcha aos limites biologicamente imputados.

Essa última condição  mecausou maior reflexão porque se trata de um grupo que já viu e viveu muita coisa e, não de repente, tem que ver a vida com certa resignação porque, afinal, não se pode lutar contra seu presente estado e, ao mesmo tempo, não todas, claro, peguei-me lembrando no olhar diferente que essas pessoas carregam, na forma como olham e concebem o mundo. Foi este olhar e esta paciência que me fez ruminar a questão da qualidade do tempo que dedicamos a certas coisas, certo momentos.

O fato de precisar enfrentar distâncias mais longas em maior tempo, sem pressa para chegar ou fazer, porque afinal as cirscuntâncias me impediam, tornou-se surpresa e deliciosamente apreciável. Ver as belezas do mundo é uma coisa; vê-las em câmera lenta, outra.

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