Porque não compro um carro - Parte II

Às vezes, tenho a impressão que algumas pessoas me olham com pena porque não tenho um carro, porque ando de ônibus. Eu gostaria que elas soubessem que tenho pena delas por terem pena de mim.

Afinal, por que ter ou não um carro é tão ruim assim? Entendo que a reação de algumas dessas pessoas são um mero ato de compadecimento com o transtorno que passo com o serviço precário do transporte público, mas outras simplesmente concebem minha realidade como... fora de realidade! Por isso, muitas vezes, alguns indivíduos não resistem em comentar: "Como assim você não tem um carro?!". Tipo, parece que estou fora de moda. Ou vivendo em uma realidade paralela. No mundo real, eu só andaria de ônibus se estivesse na Europa - onde aliás esses dignos de pena adoram se gabar que andaram de bonde para cima e para baixo.

Bom, a recorrência de me deparar com situações como essas me levaram a escrever sobre porque não tenho um carro. Depois de muito refletir, acredito que minha decisão de não me render à carrocracia está bem fundamentada - ou pelo menos me satisfaz bem. 

No tópico de abertura de toda essa discussão, apresentei a primeira razão para essa decisão, justificada principalmente pela falta de dinheiro. A segunda, está intimamente atrelada à primeira, pois continua envolvendo dinheiro, mas se trata de uma questão tão determinante, carente de maior atenção antes de adquirimos um carro, que  julguei merecer um tópico só para si.

Combustível 



Bom, nada pior do que ter um carro, mas não ter grana para bancá-lo. Não vamos nem discutir aqui a necessidade de um transporte próprio para situações do dia a dia, como ir ao trabalho, levar os filhos à escola, atender à uma emergência que requeira hospital etc., porque isto é muito óbvio. Melhor nos atermos a uma das principais razões que têm levado meus colegas a financiarem um carro. Acredite ou não, razão essa se trata basicamente de poder retirar seu veículo automotor da garagem para sair para se divertir quando bem entender, sem depender de ônibus, metrô etc. Acontece que essa comodidade acarreta muitos gastos. Exemplos (bem básicos):

  1. Boate: pagar entrada, drinques para você e às vezes até para aquela gatinha que se está querendo paquerar;
  2. Cinema: ingresso, pipoca/lanche, estacionamento do shopping;
  3. Restaurante qualquer (qualquer mesmo): não importa se é um self-service da W3, prepara-se para desembolsar um bom bocado caso não tenha vale-refeição;
  4. etcetera, etcetera, etcetera.
Agora misture tudo isso ao fato que, para qualquer lugar que você vá, pode-se preparar para gastar uma boa dose (ou tanque) de combustível, pois tudo em Brasília é longe. Reza a lenda que a cidade de Niemeyer (ai, gente, por favor, de Lucio Costa, né? ... ou seria de Kubitschek? Ai, Janaina! Foco, foco!)... pois bem, a capital federal brasileira não foi projetada para viver - ou locomover-se - sem ter um carro - porque viver, convenhamos, você vive. Aliás, achar que não ter carro em Brasília é inviável não passa de um belo de um pensamento carrocrático, porque galera poderia muito bem reivindicar transporte público que funcione (mais uma vez, tópico para outra discussão). 

Bom, acontece que "longe" adquiriu um novo significado: dar muitas voltas ou, em outras palavras, ter que passar no posto de gasolina antes (porque, com o preço da gasolina, maioria anda na reserva). E passar no posto demanda, somado os gastos acima citados, uma maior reflexão à questão. Por isso, muitos coleguinhas pensam duas vezes antes de responder ao convite no chat do Facebook. Precisam antes fazer alguns cálculos básicos. São eles (por alto):
  1. Preço da gasolina: 2,650.
  2. Para encher o tanque: cerca de 50 pilas.
  3. Entrada da festa até meia-noite: 15 pilas ele, 10 ela.
  4. Valor da comanda no fim da festa: 50 mil réis.
  5. Voltar para o estacionamento (grátis, porque o pago era muito caro) e se deparar com o "barato que sai caro", pois descobre que esvaziaram seus dois pneus porque mexeu com os playboys errados (já vi isso acontecer) é a única coisa que não tem preço aqui: ver a sua cara de tacho, realmente, pouca coisa pagaria por isso (depois de empurrar o carro até o posto de gasolina mais próximo e tentar encher o estepe sem sucesso apenas para descobrir que te venderam um furado - juro que já vi acontecer também).
Depois desses cálculos bem básicos, a balada, que super prometia, nem promete mais tanto assim. 

Mas se você é do tipo mais pacato e este caso não se aplica à sua pessoa, lembrar é viver: quem nunca presenciou uma situação corriqueira em que depois de 30 minutos presa em um desses putas engarrafamentos que invadiram Brasília devido ao aumento da frota de carros galera começa a desligar o motor para economizar no gás? E os carros que vêm com ar condicionado, então? Ouvi dizer que ar condicionado consome combustível, logo, todas abre a janela e reza para soprar uma brisa. No frio, liga-o, rapidinho, mas só para desembaçar. 

Tudo isso reflete a crucial importância de se sopesar os gastos diários com combustível, acrescidos aos mensais das parcelas do financiamento e seguro, anuais do IPVA e outros imprevistos, como pequenos acidentes/batidas que não compensam acionar o seguro, antes de entrar em uma concessionária decidido a comprar um carro. 

Se você concluir que pode adquirir um veículo sem ter que se preocupar se conseguirá abastecê-lo para ir a qualquer lugar que der na telha e sem ter que sacrificar outros gastos (murrinhar idas ao cinema, parar de frequentar cafés e bares mais caros), então vá em frente. Não hesite. Contribua para o construto social de que ter um carro é essencial. 

Quanto a mim, a questão do combustível pesou bastante antes de me decidir por comprar um automóvel. A última razão que justifica seráa em um próximo tópico. Enquanto isso, se você já pensou em adquirir um carro ou está em vias de adquirir, já pensou sobre essa questão do combustível? Como lidou ou está lidando com isso?

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